Para estimular crianças e jovens a escrever, há quem diga que escrever é fácil: basta pôr no papel o que está na cabeça. Na maioria das vezes, porém, este estímulo é deveras desestimulante. 5 Há boas explicações para o desestímulo: se a pessoa não consegue escrever, convencê-la de que escrever é fácil na verdade a convence apenas da sua própria incompetência, a convence apenas de que ela nunca vai conseguir escrever direito; não 10 se escreve pondo no papel o que está na cabeça, sob pena de ninguém entender nada; quem escreve profissionalmente nunca acha que escrever é fácil, nem mesmo quando escreve há muito tempo — a não ser que já escreva mecanicamente, apenas repetindo 15 frases e fórmulas. Via de regra, nosso pensamento é caótico: funciona para alimentar nossas decisões cotidianas, mas não funciona se for expresso, em voz alta ou por escrito, tal qual se encontra na cabeça. Para entender o nosso 20 próprio pensamento, precisamos expressá-lo para outra pessoa. Ao fazê-lo, organizamos o pensamento segundo um código comum e então, finalmente, o entendemos, isto é, nos entendemos. Não à toa o jagunço Riobaldo, personagem do escritor Guimarães 25 Rosa, dizia: professor é aquele que de repente aprende. Todo professor conhece este segredo: você entende melhor o seu assunto depois de dar sua aula sobre ele, e não antes. Ao falar sobre o meu tema, tentando explicá-lo a quem o conhece pouco, 30 aumento exponencialmente a minha compreensão a respeito. Motivado pelas expressões de dúvida e até de estupor dos alunos, refino minhas explicações e, ao fazê-lo, entendo bem melhor o que queria dizer. Costumo dizer que, passados tantos anos de 35 profissão, gosto muito de dar aula, principalmente porque ensinar ainda é o melhor método de estudar e compreender. Ora, do mesmo jeito que ensino me dirigindo a um grupo de alunos que não conheço, pelo menos 40 no começo dos meus cursos, quem escreve o faz para ser lido por leitores que ele potencialmente não conhece e que também não o conhecem. Mesmo ao escrever um diário secreto, faço-o imaginando um leitor futuro: ou eu mesmo daqui a alguns anos, 45 ou quem sabe a posteridade. Logo, preciso do outro e do leitor para entender a mim mesmo e, em última análise, para ser e saber quem sou. Exatamente porque esta relação com o outro, aluno ou leitor, é tão fundamental, todo professor sente 50 um frio na espinha quando encontra uma nova turma, não importa há quantos anos exerça o magistério. Pela mesma razão, todo escritor fica “enrolando” até começar um texto novo, arrumando a escrivaninha ou vagando pela internet, não importa quantos livros já 55 tenha publicado. Pela mesmíssima razão, todo aluno não quer que ninguém leia sua redação enquanto a escreve ou faz questão de colocá-la debaixo da pilha de redações na mesa do professor, não importa se suas notas são boas ou não na matéria. 60 Escrever definitivamente não é fácil, porque nos expõe no momento mesmo de fazê-lo. [...] Quem escreve sente de repente todas as suas hesitações, lacunas e omissões, percebendo como o seu próprio pensamento é incompleto e o quanto ainda precisa 65 pensar. Quem escreve de repente entende o quanto a sua própria pessoa é incompleta e fraturada, o quanto ainda precisa se refazer, se inventar, enfim: se reescrever.
BERNARDO, G. Conversas com um professor de literatura. Rio de Janeiro: Rocco, 2013. Adaptado.
De acordo com as ideias desenvolvidas pelo autor no texto, a dificuldade em escrever existe pela falta de
a)
dedicação diária ao hábito da leitura |
b)
interesse verdadeiro do público leitor |
c)
relação direta entre pensamento e escritaestímulo constante para a prática da redação |
d)
estímulo constante para a prática da redação |
e)
interação adequada entre professores e alunos |
Para apresentar o ponto de vista desenvolvido no segundo parágrafo, o autor emprega o seguinte recurso de organização de ideias:
a)
enumeração |
b)
comparação |
c)
descrição |
d)
gradação |
e)
relato |
Ao longo do texto, há marcas de linguagem que indicam uma aproximação, uma espécie de diálogo, que o autor estabelece com aqueles que estão lendo seu texto.
Um trecho que contém uma dessas marcas de linguagem é:
a)
“Na maioria das vezes, porém, este estímulo é deveras desestimulante.” (l. 3-4) |
b)
“Ao fazê-lo, organizamos o pensamento segundo um código comum” (l. 21-22) |
c)
“Todo professor conhece este segredo:” (l. 26) |
d)
“Ao falar sobre o meu tema, tentando explicá-lo” (l. 28-29) |
e)
“do mesmo jeito que ensino me dirigindo a um grupo de alunos” (l. 38-39) |
A analogia entre a atividade de escrita e o ofício do professor fundamenta-se no seguinte motivo:
a)
as aulas devem seguir estritamente o planejamento elaborado pelo professor. |
b)
os alunos precisam estar sempre atentos às novidades ensinadas. |
c)
a experiência acumulada conduz sempre a um exercício mecânico das atividades. |
d)
a tentativa de responder a dúvidas apresentadas aprofunda os conhecimentos do professor. |
e)
as hesitações frequentes e inseguranças podem levar ao fracasso. |
A atividade de escrita, de acordo com o texto, pressupõe o(a)
a)
domínio das estruturas linguísticas prescritas pela norma |
b)
gosto bem desenvolvido pela leitura |
c)
clareza e completude nas intenções do falante |
d)
criação de imagem de um interlocutor |
e)
utilização mecânica dos tipos textuais |
A expansão do significado mais concreto das palavras é recurso largamente utilizado.
Observa-se expansão de significado mais concreto para outro, mais abstrato, em:
a)
“a não ser que já escreva mecanicamente, apenas repetindo frases e fórmulas” (l. 13-15) |
b)
“funciona para alimentar nossas decisões cotidianas, mas não funciona se for expresso, em voz alta ou por escrito” (l. 16-18) |
c)
“professor é aquele que de repente aprende” (l. 25) |
d)
“Pela mesmíssima razão, todo aluno não quer que ninguém leia sua redação enquanto a escreve” (l. 55-57) |
e)
“Quem escreve sente de repente todas as suas hesitações, lacunas e omissões” (l. 61-63) |
A conexão entre as ações apresentadas se estabelece a partir de uma sequência temporal em:
a)
“convencê-la de que escrever é fácil na verdade a convence apenas da sua própria incompetência” (l. 6-8) |
b)
“funciona para alimentar nossas decisões cotidianas, mas não funciona se for expresso, em voz alta ou por escrito” (l. 16-18) |
c)
“Ao falar sobre o meu tema, tentando explicá-lo a quem o conhece pouco, aumento exponencialmente a minha compreensão a respeito” (l. 28-31) |
d)
“Logo, preciso do outro e do leitor para entender a mim mesmo e, em última análise, para ser e saber quem sou” (l. 45-47) |
e)
“Escrever definitivamente não é fácil, porque nos expõe no momento mesmo de fazê-lo” (l. 60-61) |
Considerando as ideias desenvolvidas no texto, observase uma visão negativa do autor sobre certo comportamento quando ele emprega a palavra que está destacada no seguinte trecho:
a)
“a não ser que já escreva mecanicamente,” apenas repetindo frases e fórmulas. (l. 13-15) |
b)
“Via de regra, nosso pensamento é caótico” (l. 16) |
c)
“Não à toa o jagunço Riobaldo, personagem do escritor Guimarães Rosa” (l. 23-25) |
d)
“ou eu mesmo daqui a alguns anos, ou quem sabe a posteridade.” (l. 44-45) |
e)
“o quanto ainda precisa se refazer, se inventar” (l. 66-67) |
Em “este estímulo é deveras desestimulante.” (l. 4), a palavra em destaque expressa ideia de
a)
tempo |
b)
dúvida |
c)
negação |
d)
condição |
e)
intensidade |
Em “nem mesmo quando escreve há muito tempo” (l.13), a palavra em destaque não possui nem gênero, masculino ou feminino, nem número, singular ou plural.
A palavra mesmo também apresenta essa característica em:
a)
“Ora, do mesmo jeito que ensino me dirigindo a um grupo de alunos” (l. 38-39) |
b)
“Mesmo ao escrever um diário secreto” (l. 42-43) |
c)
“ou eu mesmo daqui a alguns anos” (l. 44) |
d)
“Logo, preciso do outro e do leitor para entender a mim mesmo” (l. 45-46) |
e)
“porque nos expõe no momento mesmo de fazê-lo.” (l. 60-61) |
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