Por Mariana Sgarioni
Em Os Neurônios da Leitura (editora Penso, 2012, 372 páginas), o matemático e neurocientista francês Stanilas Dehaene, diretor da Unidade de Neuroimagem Cognitiva, de Paris, mostra que pesquisas da Psicologia Cognitiva Experimental comprovaram o centro de reconhecimento da palavra escrita no cérebro.
Dehaene é professor no Collège de France e membro da Academia Francesa de Ciência. Seus primeiros trabalhos foram voltados ao estudo sobre a maneira com que o órgão funciona no consciente e no inconsciente. O cientista sugere que a Pedagogia e a Psicologia busquem beneficiar-se dos estudos da neurociência para criar métodos de ensino mais eficazes.
Nesta entrevista, o francês defende que tal descoberta questiona metodologias de ensino que transformam o aluno numa máquina de soletrar, incapaz de dar atenção ao significado.
O senhor diz que a leitura causa reviravolta nas funções cerebrais preexistentes. Por quê? Em primeiro lugar, gostaria de lembrar que a leitura é uma das várias atividades que o homem criou nos últimos milhares de anos. E trata-se de uma das mais recentes. A escrita nasceu há uns 5.400 anos e o alfabeto propriamente dito não tem mais de 3.800 anos. Nos termos da evolução humana, esse tempo é mínimo. Nosso genoma ainda não teve tempo de se alterar para dar conta de desenvolver um cérebro adaptado à leitura. Por isso, afirmo que o ato de ler é uma revolução: porque, mesmo sem termos esta capacidade, o estudo de imagens cerebrais nos mostra que adquirimos mecanismos extremamente requintados, exigidos pelas operações da leitura.
Como isso acontece em nosso cérebro? Temos uma plasticidade sináptica desde que nascemos até a idade adulta. É ela que faz uma reconversão parcial da arquitetura do nosso córtex visual de primatas para reconhecer letras e palavras. Aprender a ler possibilita uma conversão de redes de neurônios, inicialmente dedicadas ao reconhecimento visual dos objetos. Embora não exista uma área préprogramada para a leitura, podemos localizar diversos setores do córtex cerebral como responsáveis pela atividade. Um setor está em contato com as entradas visuais; outro codifica estas entradas com precisão espacial; outro integra as entradas de uma vasta região da retina, e assim sucessivamente. É no córtex que estão os neurônios mais adaptados à tarefa da leitura. Mais especificamente, no córtex occipitotemporal esquerdo. No entanto, se no curso da aprendizagem, por alguma razão, esta região não estiver disponível, então a região simétrica do hemisfério direito entra em jogo.
O cérebro é tão plástico que é capaz de se transformar e atender a qualquer necessidade? Não. Há a teoria, aliás, revisitada por inúmeros pesquisadores, que adere a um modelo que eu chamo de plasticidade generalizada e relativismo cultural. Segundo ela, o cérebro seria tão flexível e maleável que não restringiria em nada a amplitude das atividades humanas. Diferentemente de outras espécies, inclusive, ele seria capaz de absorver toda forma de cultura. Pretendo mostrar em meu livro que dados recentes da imagem cerebral e da Neuropsicologia recusam esse modelo simplista. Ao examinar a organização cerebral dos circuitos da leitura, vemos que é falsa a ideia de um cérebro virgem, infinitamente maleável, capaz de absorver todos os dados de sua cultura. Entretanto, somos capazes de atividades extraordinárias, como ler. Sim, nosso cérebro é evidentemente capaz de aprender. Porém, essa capacidade é limitada. Em todos os indivíduos do mundo, não importa a cultura ou o idioma, a mesma região cerebral - com diferenças mínimas - é ativada para decifrar palavras escritas. Minha hipótese é diferente desta do relativismo. Proponho o que chamo de "reciclagem neuronal".
De acordo com essa hipótese, acredito que a arquitetura do nosso cérebro é construída com bases fortes genéticas. Mesmo assim, os sentidos do nosso córtex visual possuem uma margem de adaptação, uma vez que a evolução nos dotou de certa plasticidade e capacidade de aprendizagem. Isso quer dizer que os mesmos neurônios que reconhecem rostos ou corpos podem desviar-se de suas preferências e responder a objetos ou formas artificiais, como as letras. Nosso cérebro se adapta ao ambiente cultural não respondendo cegamente a tudo o que lhe é imposto. Ele converte a outro uso suas disposições já presentes. Ele faz o novo com o velho. O cérebro não evoluiu para a escrita. Foi a escrita que evoluiu para nosso cérebro. Examine com atenção os sistemas de escrita. Eles revelam numerosos traços em comum: todos os sistemas, sem exceção, incluindo aí os caracteres chineses, usam um pequeno repertório de base, cuja combinação gera sons, sílabas e palavras. Essa organização se ajusta à hierarquia das nossas áreas corticais, cujos neurônios reconhecem unidades de tamanho e invariância crescentes. O tamanho e a posição dos caracteres também correspondem à nossa capacidade de visualização e retenção.
Entrevista disponível em: http://revistalingua.uol.com.br/textos/87/ler-e-uma-
revolucao-cerebral- 276200-1.asp Acesso em: 4 jun.2013. [Fragmento]
Com base nessa entrevista, depreende-se que, a partir de sua descoberta, o neurocientista Stanilas Dehaene
a)
defende novas metodologias de ensino, para que os alunos sejam mais ágeis ao soletrar palavras. |
b)
descreve a maneira pela qual o cérebro humano funciona no consciente e no inconsciente. |
c)
destaca a importância dos estudos da neurociência na criação de métodos de ensino eficientes. |
d)
questiona a existência, no cérebro humano, de um centro de reconhecimento da palavra escrita. |
De acordo com o texto, a leitura é uma
a)
atividade criada pela humanidade há menos de 3.800 anos. |
b)
maneira de o homem compreender sua plasticidade sináptica. |
c)
reviravolta causada por várias funções cerebrais preexistentes. |
d)
revolução que envolve operações e mecanismos requintados. |
Assinale a alternativa em que há evidência de subjetividade no trecho da entrevista transcrito abaixo.
a)
Aprender a ler possibilita uma conversão de redes de neurônios, inicialmente dedicadas ao reconhecimento visual dos objetos. |
b)
É no córtex que estão os neurônios mais adaptados à tarefa da leitura. Mais especificamente, no córtex occipitotemporal esquerdo. |
c)
De acordo com essa hipótese, acredito que a arquitetura do nosso cérebro é construída com bases fortes genéticas. |
d)
Nosso cérebro se adapta ao ambiente cultural, não respondendo cegamente a tudo o que lhe é imposto. |
Segundo o cientista, o modelo denominado “plasticidade generalizada e relativismo cultural” é simplista porque
a)
avaliações do cérebro confirmam que ele é muito flexível e maleável; constatação que o leva a não restringir em nada a amplitude das atividades humanas. |
b)
dados recentes da imagem cerebral comprovaram que a atividade cognitiva é maleável e flexível, conforme estudos da Neuropsicologia e da Psicologia Cognitiva Experimental. |
c)
estudos mostram que o cérebro humano é infinitamente diferente do cérebro de outras espécies, uma vez que ele absorve todos os dados de uma determinada cultura. |
d)
exames demonstram que a organização cerebral dos circuitos da leitura apontam para a inexistência de um cérebro virgem, capaz de absorver todos os dados de cultura. |
Os prefixos são morfemas colocados antes dos radicais com a finalidade de modificar o sentido das palavras; raramente esses morfemas produzem mudança de classe gramatical.
Observe os seguintes fragmentos do texto.
I. “O senhor diz que a leitura causa reviravolta” [...].
II. “É ela que faz uma reconversão parcial da arquitetura do nosso córtex” [...].
III. “Há a teoria, aliás, revisitada por inúmeros pesquisadores” [...].
IV. “Proponho o que chamo de ‘reciclagem neuronal’".
O prefixo re está presente nas palavras dos itens
a)
I e II, apenas. |
b)
III e IV, apenas. |
c)
II, III e IV, apenas. |
d)
I, II, III e IV. |
Assinale a alternativa em que o termo que destacado NÃO introduz uma oração subordinada substantiva objetiva direta.
a)
Em primeiro lugar, gostaria de lembrar que a leitura é uma das várias atividades que o homem criou nos últimos milhares de anos. |
b)
O cérebro é tão plástico, que é capaz de se transformar e atender a qualquer necessidade? |
c)
Pretendo mostrar em meu livro que dados recentes da imagem cerebral e da Neuropsicologia recusam esse modelo simplista. |
d)
Acredito que a arquitetura do nosso cérebro é construída com bases fortes genéticas. |
Assinale a alternativa em que a ideia apresentada entre parênteses explicita o sentido introduzido pelo termo destacado no trecho.
a)
Nosso genoma ainda não teve tempo de se alterar para dar conta de desenvolver um cérebro adaptado à leitura. (consequência) |
b)
Por isso, afirmo que o ato de ler é uma revolução. (finalidade) |
c)
Embora não exista uma área pré-programada para a leitura, podemos localizar diversos setores do córtex cerebral [...]. (conclusão) |
d)
Entretanto, somos capazes de atividades extraordinárias, como ler. (oposição) |
Observe o emprego de crase nestes trechos do texto:
I. Nosso genoma ainda não teve tempo de se alterar para dar conta de desenvolver um cérebro adaptado à leitura.
II. É no córtex que estão os neurônios mais adaptados à tarefa da leitura. Mais especificamente, no córtex occipitotemporal esquerdo.
III. Essa organização se ajusta à hierarquia das nossas áreas corticais, cujos neurônios reconhecem unidades de tamanho e invariância crescentes.
IV. O tamanho e a posição dos caracteres também correspondem à nossa capacidade de visualização e retenção.
Considerando-se as normas de regência da Gramática da Língua Portuguesa, é CORRETO afirmar que o emprego da crase é
a)
obrigatório em I, II, III e IV. |
b)
obrigatório apenas em III. |
c)
facultativo apenas em I e II. |
d)
facultativo apenas em IV. |
Leia este trecho.
Proponho o que chamo de "reciclagem neuronal"
Nesse trecho, as aspas foram empregadas para
a)
acentuar o valor significativo de uma expressão em desuso. |
b)
dar especial realce ao emprego irônico de uma expressão. |
c)
fazer sobressair uma expressão pouco conhecida ou peculiar. |
d)
introduzir uma citação, distinguindo-a do restante do contexto. |
O emprego das vírgulas ou o dos ponto e vírgulas está CORRETAMENTE justificado em:
a)
Em primeiro lugar, gostaria de lembrar que a leitura é uma das várias atividades que o homem criou nos últimos milhares de anos. - Emprega-se a vírgula para isolar o aposto ou qualquer elemento de valor meramente explicativo. |
b)
Um setor está em contato com as entradas visuais; outro codifica estas entradas com precisão espacial; outro integra as entradas de uma vasta região da retina, e assim sucessivamente. - Emprega-se o ponto e vírgula para separar, num período, orações de mesma natureza que tenham certa extensão. |
c)
No entanto, se no curso da aprendizagem, por alguma razão, esta região não estiver disponível, então a região simétrica do hemisfério direito entra em jogo. - Emprega-se vírgula para separar elementos que exercem a mesma função sintática em um período. |
d)
Diferentemente de outras espécies, inclusive, ele seria capaz de absorver toda forma de cultura. - Emprega-se vírgula para isolar um adjunto adverbial anteposto. |
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