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Informações da Prova Questões por Disciplina TRT - 15.ª Região - Técnico Judiciário - Administrativa - FCC - Fundação Carlos Chagas - 2013 - Prova Objetiva

Língua Portuguesa

Da estátua à pedra

Atenção: Considere o texto abaixo para responder à(s) questão(ões) a seguir.

Com alguma surpresa de quem me escuta, desde há algum tempo venho a dizer que cada vez me interessa menos falar de literatura. Pode parecer isto uma provocação, a atitude do escritor que, para se tornar mais interessante, lança declarações inesperadas e gratuitas. E não é assim. A verdade é que duvido mesmo que se possa falar de literatura como duvido, com mais razões, que se possa falar de pintura ou que se possa falar de música. É claro que se pode falar de tudo, como se fala dos sentimentos e emoções, seria absurdo pretender reduzir ao silêncio aqueles que escrevem, ou aqueles que leem, ou aqueles que sentem, ou aqueles que compõem música ou que pintam ou que esculpem, como se a obra em si mesma já contivesse tudo quanto é possível dizer e que tudo o que vem depois não fosse mais do que interminável glosa. Não é isso. Acontece, no entanto, que por vezes experimento o desejo de limitar-me a uma muda contemplação diante de uma obra acabada, pela consciência que tenho de que, de certa maneira, nos domínios da arte e da literatura estamos lidando com aquilo a que damos o nome de inefável. [...]

Quero dizer, não obstante, que antes de começar a escrever sustentava como uma evidência palmária (por outro lado nada original) que somos herdeiros de um tempo, de uma cultura e que, para usar um símile que algumas vezes empreguei, vejo a humanidade como se fosse o mar. Imaginemos por um momento que estamos numa praia: o mar está ali, e continuamente aproxima-se em ondas sucessivas que chegam à costa. Pois bem, essas ondas, que avançam e não poderiam mover-se sem o mar que está por detrás delas, trazem uma pequena franja de espuma que avança em direção à praia onde vão acabar. Penso, continuando a usar esta metáfora marítima, que somos nós a espuma que é transportada nessa onda, essa onda é impelida pelo mar que é o tempo, todo o tempo que ficou atrás, todo o tempo vivido que nos leva e nos empurra. Convertidos numa apoteose de luz e de cor entre o espaço e o mar, somos, os seres humanos, essa espuma branca brilhante, cintilante, que tem uma breve vida, que despede um breve fulgor, gerações e gerações que se vão sucedendo umas às outras transportadas pelo mar que é o tempo. E a história, onde fica? Sem dúvida a história preocupa-me, embora seja mais certo dizer que o que realmente me preocupa é o Passado, e sobretudo o destino da onda que se quebra na praia, a humanidade empurrada pelo tempo e que ao tempo sempre regressa, levando consigo, no refluxo, uma partitura, um quadro, um livro ou uma revolução. Por isso prefiro falar mais de vida do que de literatura, sem esquecer que a literatura está na vida e que sempre teremos perante nós a ambição de fazer da literatura vida.

(SARAMAGO, José. Da estátua à pedra. Belém: ed. ufpa; Lisboa: Fundação José Saramago, 2013. p. 25-27)

1 -

O texto se apresenta como:

a)

depoimento do escritor, de que se depreende que o ser humano constitui sua prioridade absoluta, como objeto da criação artístico-literária.

b)

relato em que o autor expõe as bases da criação artística em todas as suas manifestações, defendendo a importância da literatura como registro da história da humanidade

c)

desabafo em que se dilui certo desencanto com as artes, em geral, por se mostrarem incapazes de reproduzir a totalidade da vida humana.

d)

exposição teórica de algumas formas de expressão artística, inclusive da criação literária, principalmente as que transmitem uma beleza incontestável.

e)

defesa do necessário respeito à natureza, por ser ela a imagem perfeita dos sentimentos e dos valores em toda a história da humanidade.

2 -

É correto afirmar, considerando-se o teor do texto, que:

a)

a verdadeira arte, por exemplo, de uma pintura, deve despertar no observador sentimentos contraditórios, que vão da admiração à incompreensão.

b)

a vida humana, com suas variadas manifestações a todo tempo e em todos os lugares, constitui matéria fundamental para a criação literária.

c)

a literatura, que reproduz sentimentos humanos, não deve se sujeitar a eventuais definições, pois estas tendem a reduzir a originalidade que a valoriza.

d)

as diversas formas de manifestação artística, exceto a literatura, levam a situações que escapam a uma avaliação crítica mais objetiva.

e)

a obra de arte, para ser assim considerada, deve esgotar em si mesma todas as infinitas possibilidades de criação que constituem a natureza humana, ao longo da história.

3 -

No 1.º parágrafo, o autor deixa claro que:

a)

as verdadeiras obras de arte, principalmente as que compõem a literatura, somente serão assim consideradas, se conseguirem esgotar tudo aquilo que se possa dizer sobre a vida humana.

b)

sempre é possível aos artistas, em qualquer área de criação, expor novas ideias e sentimentos em suas obras, pois nenhuma delas deve ser vista como algo completo e definitivamente acabado.

c)

vem se decepcionando com a superficialidade de certas obras de arte, não só as que compõem a literatura, pois seus autores se mostram incapazes de revelar os verdadeiros sentimentos humanos.

d)

a criação artística, à semelhança dos sentimentos humanos, supera qualquer tentativa de análise, cabendo, no mais das vezes, uma atitude contemplativa diante de algo por si indescritível.

e)

é possível qualificar com precisão uma obra de arte considerando sua originalidade ou beleza, qualquer que seja a modalidade escolhida por seus autores para manifestar suas ideias.

4 -

A verdade é que duvido mesmo que se possa falar de literatura como duvido, com mais razões, que se possa falar de pintura ou que se possa falar de música.

É claro que se pode falar de tudo, como se fala dos sentimentos e emoções...

A insistência no emprego do verbo falar, nas afirmativas acima, demonstra:

a)

atribuição de diferentes sentidos a um único verbo, pois a linguagem de uma obra de arte deve sempre valer-se de imagens originais, que lhe dão valor.

b)

alguma inconsistência nos argumentos de que se vale o autor, que se contradiz na referência às formas de expressão de emoções.

c)

intencionalidade em acentuar as diferentes formas de expressão artística e de sentimentos humanos, nem sempre sujeitas a uma interpretação objetiva.

d)

desconsideração a certas criações artísticas que tratam com superficialidade, por vezes, toda a amplitude das emoções na vida humana.

e)

complementaridade entre uma atitude crítica e um posicionamento contemplativo perante uma obra de arte.

5 -

... a humanidade empurrada pelo tempo e que ao tempo sempre regressa, levando consigo, no refluxo, uma partitura, um quadro, um livro ou uma revolução.

A imagem criada pela afirmativa acima traduz, em síntese,

a)

a incapacidade humana de superar os limites impostos pelo tempo, que dificulta a criação de obras de arte que possam ser valorizadas pelas gerações seguintes.

b)

a visão de que o homem, que ocupa um breve instante na história, será sempre um criador, sujeito às influências de sua época.

c)

toda a história da humanidade representada no vai-vém das ondas marítimas que, apesar de sua beleza, trazem também destruição e dor.

d)

a impotência do ser humano, pequeno diante da força da natureza, em reproduzir com profundidade todas as características de seu tempo.

e)

a noção de que o tempo deverá assinalar sempre o eterno retorno do ser humano ao início de sua história e de suas primeiras manifestações artísticas

6 -

... sustentava como uma evidência palmária (por outro lado nada original) que somos herdeiros de um tempo...

O comentário isolado pelos parênteses deve ser entendido como:

a)

constatação de que a evidência sustentada era de conhecimento geral e amplamente aceita.

b)

citação de interlocutor alheio ao contexto, para facilitar o entendimento da ideia exposta.

c)

reconhecimento do escritor de que sua obra, ao reproduzir a vida, nada tem de particular e diferente.

d)

observação crítica a respeito da presença do senso comum em algumas obras de arte atuais.

e)

especificação de elementos que devem constituir a base da elaboração de uma obra de arte.

7 -

Dentre as possíveis acepções da palavra MAR, encontradas em dicionários, a que corresponde fielmente à metáfora marítima criada por Saramago é:

a)

conjunto que ondula, se agita, apresenta flutuações.

b)

local próximo à praia, em que é pequena a profundidade das águas.

c)

grande extensão, a perder de vista, ou grande quantidade de qualquer coisa.

d)

o que absorve, especialmente pelo mistério, pela imensidade.

e)

extensão de água salgada, de dimensões relativamente limitadas.

8 -

Nos segmentos abaixo, a relação sintático-semântica estabelecida entre as orações está indicada corretamente em:

a)

Por isso prefiro falar mais de vida do que de literatura... - identifica-se uma condição no exemplo transcrito.

b)

... não obstante, que antes de começar a escrever... - o segmento se inicia por uma locução que introduz sentido explicativo.

c)

... para se tornar mais interessante, lança declarações inesperadas e gratuitas. - a conjunção introduz noção de comparação entre duas situações distintas, com oposição de sentido.

d)

... como se a obra em si mesma já contivesse tudo quanto é possível dizer... - o exemplo denota noção de tempo.

e)

... aqueles que escrevem, ou aqueles que leem, ou aqueles que sentem, ou aqueles que compõem música ou que pintam ou que esculpem... - a conjunção que se repete une segmentos semelhantes que exprimem equivalência de conceitos.

9 -

... que somos nós a espuma que é transportada nessa onda, essa onda é impelida pelo mar que é o tempo, todo o tempo que ficou atrás, todo o tempo vivido que nos leva e nos empurra.

Uma redação alternativa para o segmento acima, respeitando-se o sentido original e mantendo-se a coesão e a clareza, está em:

a)

essa onda, que transporta a espuma, que é todos nós, vai impelindo o tempo - que é o mar - esse que nos leva e empurra, assim como essa espuma.

b)

como somos nós a espuma do tempo levado na onda do mar, a quem este tempo - que vem vivido de muito antes -, está levando e empurrando.

c)

que a espuma que se transporta nessa onda, é ela impelida ao mar - ou seja - o tempo que ficou atrás sendo vivido, nos levando e empurrando.

d)

o mar é o tempo, todo o tempo - atrás e vivido - o qual o mar vai impelindo, nos levando e empurrando, ainda, nessa onda que se transporta.

e)

que nós somos a espuma transportada pela onda, impelida pelo mar - o tempo anterior, vivido em sua totalidade, a nos levar e empurrar.

10 -

Hora de ter saudade

Houve aquele tempo...

(E agora, que a chuva chora,

Ouve aquele tempo!)

(ALMEIDA, Guilherme de. Poesia vária. Cultrix: São Paulo, 3 ed., p.45)

A afirmativa correta, considerando-se o poema acima, é:

a)

A oposição entre aquele tempo e agora atesta a manutenção de um sentimento que supera todas as intempéries, sobrevivendo ao tempo que passa.

b)

O título do poema traduz certa estranheza, como estímulo à leitura, ao sugerir a vivência contida em todo aquele tempo que passou naturalmente.

c)

A repetição da expressão aquele tempo cria intencionalmente uma ambiguidade de sentidos dentro do poema, relacionando-a com a hora a que se faz referência no título.

d)

A alternância no emprego dos verbos haver, no pretérito perfeito do indicativo, e ouvir, na forma de imperativo, confere sentido ao título do poema.

e)

A saudade expressa na chuva que chora remete a um tempo passado, embora traga no seu bojo a esperança de retomada no presente, como a planta que reverdece.

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