O tempo, como o dinheiro, é um recurso escasso. Isso
poderia sugerir que ele se presta, portanto, à aplicação do cálculo
econômico visando o seu melhor proveito. O uso racional
do tempo seria aquele que maximiza a utilidade de cada hora
do dia. Diante de cada opção de utilização do tempo, a pessoa
delibera e escolhe exatamente aquela que lhe proporciona a
melhor relação entre custos e benefícios.
Ocorre que a aplicação do cálculo econômico às decisões
sobre o uso do tempo é neutra em relação aos fins, mas
exigente no tocante aos meios. Ela cobra uma atenção alerta e
um exercício constante de avaliação racional do valor do tempo
gasto. O problema é que isso tende a minar uma certa disposição
à entrega e ao abandono, os quais são essenciais nas atividades
que envolvem de um modo mais pleno as faculdades humanas.
A atenção consciente à passagem das horas e a preocupação
com o seu uso racional estimulam a adoção de uma
atitude que nos impede de fazer o melhor uso do tempo.
Valéry investigou a realidade dessa questão nas condições
da vida moderna: “O lazer aparente ainda permanece conosco
e, de fato, está protegido e propagado por medidas legais
e pelo progresso mecânico. O nosso ócio interno, todavia, algo
muito diferente do lazer cronometrado, está desaparecendo. Estamos
perdendo aquela vacuidade benéfica que traz a mente de
volta à sua verdadeira liberdade. As demandas, a tensão, a
pressa da existência moderna perturbam esse precioso repouso.”
O paradoxo é claro. Quanto mais calculamos o benefício
de uma hora “gasta” desta ou daquela maneira, mais nos
afastamos de tudo aquilo que gostaríamos que ela fosse: um
momento de entrega, abandono e plenitude na correnteza da
vida. Na amizade e no amor; no trabalho criativo e na busca do
saber; no esporte e na fruição do belo − as horas mais felizes
de nossas vidas são precisamente aquelas em que perdemos a
noção da hora.
(Adaptado de Eduardo Giannetti. O valor do amanhã. São
Paulo, Cia. das Letras, 2005, p.206-209)
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