Nesta época do ano, é impossível escapar da tentação de fazer previsões. Afinal, desde a pré-história, o homem não deixa de querer conhecer o futuro e de dominá-lo. Das técnicas de adivinhação inventadas pelos povos da Antiguidade aos métodos “científicos” elaborados por técnicos, os meios de predição variam: astrologia, leitura da borra de café ou cartas, até por internet. Pouco importa. Cada época tem necessidade de sonhar com um amanhã: melhor ou pior. Oráculos, profecias, predições, utopias, todas as antecipações que os homens construíram, no decorrer da história, não se realizaram. Mas elas são reflexos de suas esperanças e crenças. (...)
Um poeta disse que, para ser profeta, bastava ser pessimista. Já na metade do século 19, havia quem escrevesse sobre um mundo futuro mecanizado, sem ideias espirituais, vivendo-se ao ritmo das crises econômicas e ameaças de guerra. Marcados pela Primeira Guerra Mundial, muitos pensadores fizeram coro ao pessimismo. Freud contestou a ideia de progresso e supôs a existência de um instinto de destruição. Não faltou quem visse nas marcas do tempo o anúncio do fim de tudo, ou uma caminhada na direção ao sofrimento, como predisse o escritor George Orwell. Boa parte desse pessimismo se enraizava na tomada de consciência de uma distância crescente entre progresso técnico e progresso moral. Para solucionar essa pendência, em 1971, o Clube de Roma reuniu uma elite de pensadores. Conclusão? O grupo anteviu que o crescimento demográfico e econômico provocaria uma catástrofe e uma crise ecológica sem precedentes, em meados do século 21.
E nós ainda acreditamos em previsões? Acho que, se os brasileiros mudaram, foi no sentido de não acreditarem mais nelas. Deixamos para trás a atitude infantil de insistir em sonhos que acabam em decepções. Ou de crer em falsas promessas. Nunca o futuro foi tão misterioso quanto neste início de século 21. Nenhuma máquina de previsão conseguiu explicar a complexidade do mundo atual, onde tudo se confunde, onde realidade e espetáculo se misturam, valores e ideologias desmoronam, tudo se desencanta. Aquecimento do planeta, desastres climáticos, aumento do nível dos oceanos, fim das florestas, fome, corrupção em toda a parte, empobrecimento dos mais pobres, enriquecimento dos mais ricos, enfim, a lista é longa. A resposta, talvez, esteja em fugir das previsões de futuro e jogar no presente. Vivê-lo com delicadeza e investir nos pequenos prazeres. Fórmula excelente para enfrentarmos o apocalipse, como querem muitos. Ou o paraíso, como esperam outros.
(Mary Del Priore, O Estado de S.Paulo, 03.01.2010. Adaptado)
A respeito do texto, pode-se concluir que:
a)
para enfrentar as incertezas do futuro, os desequilíbrios provocados pelo clima e pela desigualdade entre pobres e ricos, a solução é dedicar-se aos momentos presentes de forma suave e prazerosa. |
b)
ninguém conseguiu até hoje decifrar o futuro, no entanto, o século 21, ao mesmo tempo misterioso e complexo, acena com possibilidades de se reverter, pela primeira vez, essa situação. |
c)
a descrença cada vez maior em previsões e em profecias que nunca se cumpriram é a garantia de que se pode delinear, com clareza, um futuro mais promissor e menos misterioso. |
d)
o investimento nos pequenos prazeres do presente pode seduzir as pessoas, mas não se configura como uma fórmula ideal para o enfrentamento dos problemas que o mundo hoje apresenta. |
e)
o progresso técnico, acompanhado do progresso moral, constitui-se numa síntese perfeita, capaz de solucionar os enigmas que sempre vêm rondando, em especial, os mistérios do século 21. |
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