Nenhum outro período da história brasileira
testemunhou mudanças tão profundas, decisivas
e aceleradas quanto os treze anos (1808-1821) em que
a corte portuguesa morou no Rio de Janeiro. Num espaço
5 de apenas uma década e meia, o Brasil deixou de ser
uma colônia fechada e atrasada para se tornar um país
independente. Por essa razão, o balanço que a maioria
dos estudiosos faz de D. João VI tende a ser positivo,
apesar de todas as fraquezas pessoais do rei. Para o
10 historiador Oliveira Lima, ele foi "o verdadeiro fundador
da nacionalidade brasileira", por duas razões principais:
assegurou a integridade territorial e deu início à classe
dirigente que se reponsabilizaria pela construção do
novo país. "Com ele começou a descolonização efetiva",
15 afirmou o escritor e crítico literário paranaense Wilson
Martins. "Não só pelo fato de elevar o Brasil a reino, mas
também, e sobretudo, por lhe dar desde logo e em
breve espaço de tempo as estruturas de uma nação
propriamente dita."
20 Uma forma de avaliar a herança de D. João VI
é abordar a questão pelo avesso: como seria o Brasil
se a corte não tivesse vindo para o Rio de Janeiro?
Apesar da relutância em fazer conjecturas, boa parte
dos historiadores concorda que o país simplesmente não
25 existiria na sua forma atual. Na hipótese mais provável, a
Independência e a República teriam vindo mais cedo,
mas a antiga colônia portuguesa se fragmentaria em um
retalho de pequenos países autônomos, muito parecido
com seus vizinhos da América espanhola, sem nenhuma
30 outra afinidade além do idioma.
É fácil imaginar as conseqüências dessa
separação:
• Esse Brasil dividido em pedaços autônomos nem
de longe teria o poder e a influência que o país
35 exerce hoje sobre a América Latina. Na ausência de
um Brasil grande e integrado, o papel provavelmente
caberia à Argentina, que seria, então, o maior país
do continente. [...]
• Na escola, quando abrissem seus livros de
40 Geografia, as crianças gaúchas aprenderiam que
a floresta amazônica é um santuário ecológico de
um país distante, situado ao norte, na fronteira com
a Colômbia, a Venezuela e o Peru.
• As diferenças regionais se teriam acentuado.
45 É possível que, a esta altura, as regiões mais ricas
desse mosaico geográfico estivessem discutindo
medidas de controle da imigração dos vizinhos
mais pobres, como fazem hoje os americanos
em relação aos mexicanos.
50 • Nordestinos seriam impedidos de migrar para
São Paulo. Em contrapartida, ao viajar de férias
para as paradisíacas praias da Bahia ou do Ceará,
os paulistas teriam de providenciar passaportes e,
eventualmente, pedir vistos de entrada. [...]
55 À luz da realidade do Brasil atual, tudo isso parece
mero devaneio. Ainda assim, não se deve subestimar a
importância de D. João VI na construção da identidade
dos brasileiros de hoje. [...]
Graças a D. João VI, o Brasil se manteve como
60 um país de dimensões continentais, que hoje é o maior
herdeiro da língua e da cultura portuguesas. "D. João VI
veio criar e realmente fundou na América um império, pois
merece bem assim ser classificado o ter dado foros de
nacionalidade a uma imensa colônia amorfa", escreveu
65 Oliveira Lima. Ironicamente, esse legado não seria
desfrutado por D. João ou pela metrópole portuguesa.
"Ele próprio regressava menos rei do que chegou",
acrescentou Oliveira Lima. "Deixava contudo o Brasil
maior do que o encontrara". Em outras palavras, ao
70 mudar o Brasil, D. João VI o perdeu para sempre.
GOMES, Laurentino. 1808. São Paulo: Planeta, 2007.
Qual dos trechos abaixo faz o resumo dos tópicos apresentados pelo autor em forma de estrutura itemizada, mantendo as informações dadas, sem alteração de ordem e de sentido?
a)
Se o Brasil fosse dividido e tivesse seu território fragmentado em pequenos países, a Amazônia seria para as crianças gaúchas um paraíso ecológico muito distante e pertencente a um outro país. Assim, com a acentuação das diferenças regionais surgiriam questões de mobilidade populacional e nasceriam discussões sobre passaporte e necessidade ou não de emissão de visto. Logo, o Brasil perderia poder. |
b)
Com o Brasil dividido, a hegemonia político-econômica do continente passaria à Argentina. O Rio Grande do Sul e suas crianças olhariam a Amazônia como paraíso ecológico distante. Dados esses fatos, regiões mais ricas, como as do sul e do sudeste, discutiriam não só aspectos de imigração como também burocráticos, como, por exemplo, emissão de passaporte. Já os mais pobres teriam dificuldade de locomoção. |
c)
Sem a manutenção da integridade territorial, o Brasil perderia sua unidade por causa da fragmentação dos estados em pequenos países e haveria a perda de controle do continente sul-americano. Questões migratórias nasceriam e os gaúchos concluiriam que a Amazônia, com sua paradisíaca reserva ecológica, é território de longínquo país que faz fronteira com Colômbia, Venezuela e Peru. |
d)
A divisão do Brasil provocaria questões internas como, por exemplo, a de educação. Neste caso, as aulas de geografia seriam diferentes para gaúchos e nordestinos. Os primeiro aprenderiam que a Amazônia é região que faz fronteira com Colômbia, Venezuela e Peru. Além do mais, os segundos teriam dificuldades em se locomoverem para São Paulo. Já os paulistas necessitariam de passaporte para as férias nas praias nordestinas. |
e)
O Brasil dividido perderia a ascendência que possui sobre a América Latina e faria com que crianças sulinas aprendessem que a Amazônia é reserva ecológica de um país fronteiriço a outros do norte do continente. Acentuadas as diferenças regionais, razões de ordem econômica causariam questões migratórias e os deslocamentos de habitantes necessitariam de aprovações de seus governos. |
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