O processo impregnado de complexidade, ao qual se sobrepõem ideias de avanço ou expansão intensamente ideologizadas, e que convencionamos chamar pelo nome de progresso, tem, dentre outros, um atributo característico: tornar a organização da vida cada vez mais tortuosa, ao invés de simplificá-la. Progredir é, em certos casos, sinônimo de complicar. Os aparelhos, os sinais, as linguagens e os sons gradativamente incorporados à vida consomem a atenção, os gestos, a capacidade de entender. Além disso, do manual de instruções de um aparelho eletrônico à numeração das linhas de ônibus, passando pelo desenho das vias urbanas, pelos impostos escorchantes e pelas regras que somos obrigados a obedecer – inclusive nos atos mais simples, como o de andar a pé −, há uma evidente arbitrariedade, às vezes melíflua, às vezes violenta, que se insinua no cotidiano.
Não há espaço melhor para averiguarmos as informa- ções acima do que os principais centros urbanos. Na opinião do geógrafo Milton Santos, um marxista romântico, “a cidade é o lugar em que o mundo se move mais; e os homens também. A co-presença ensina aos homens a diferença. Por isso, a cidade é o lugar da educação e da reeducação. Quanto maior a cidade, mais numeroso e significativo o movimento, mais vasta e densa a co-presença e também maiores as lições de aprendizado”.
Essa linha de pensamento, contudo, não é seguida por nós, os realistas, entre os quais se inclui o narrador de O silenceiro, escrito pelo argentino Antonio di Benedetto. Para nós, o progresso transformou as cidades em confusas aglomerações, nas quais a opressão viceja. O narrador-personagem do romance de Di Benedetto anseia desesperadamente pelo silêncio. Os barulhos, elementos inextricáveis da cidade, intrometem-se no cotidiano desse homem, ganhando existência própria. E a pró- pria espera do barulho, sua antevisão, a certeza de que ele se repetirá, despedaça o narrador. À medida que o barulho deixa de ser exceção para se tornar a norma irrevogável, fracassam todas as soluções possíveis.
A cidade conspira contra o homem. As derivações da tecnologia fugiram, há muito, do nosso controle.
(Adaptado de: GURGEL, Rodrigo. Crítica, literatura e narratofobia. Campinas, Vide Editorial, 2015, p. 121-125)
Mantendo-se a correção gramatical e, em linhas gerais, o sentido original, uma redação alternativa para um segmento do texto está em:
a)
O narrador de O silenceiro, escrito pelo argentino Antonio di Benedetto, encontra-se entre os que seguem a ideia de que, com o progresso, as cidades foram transformadas em confusas aglomerações. |
b)
Ganhando existência própria, os barulhos − elementos inextricáveis da cidade −, intrometem-se no cotidiano desse homem. |
c)
À espera do barulho e à ideia de que certamente se repetirá o narrador despedaça-se ante sua visão. |
d)
Gradativamente incorporados à vida: os aparelhos, os sinais, as linguagens e os sons consomem-nos a atenção, os gestos e a capacidade de lhes entender. |
e)
Impregnado de complexidade, o processo que convencionamos chamar pelo nome de progresso, ao qual se sobrepõe ideias de avanço torna a organização da vida cada vez mais tortuosa. |
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