Estamos todos surdos Nós, brasileiros, temos uma enorme relutância em conviver com opiniões contrárias das nossas Meu tio Élvio falava tão rápido e com um sotaque tão forte – mineirês da roça misturado a alguma coisa parecida com dialeto italiano da roça – que quase nin- guém o entendia. Honesto, trabalhador, devotava-se por inteiro à família. Pouco porém participava da vida em comunidade, porque as sentenças que pronun- ciava, ininteligíveis, muitas vezes o colocavam em situ- ações bastante complicadas, já que o interlocutor, não atinando com suas declarações, buscava adivinhá-las e depreendia o que melhor lhe aprouvesse. Só para se ter uma ideia do tamanho do problema, somente ao morrer descobrimos que seu nome não era Élvio, e sim Elmo. Mas, então, tarde demais. Se algum dia for a Rodeiro, verá inscrito em seu túmulo Élvio Gardone e entre parênteses Elmo Cardoni. Lembrei-me de meu tio porque cada vez mais me assusta a dificuldade que encontramos no dia a dia de manter diálogos, devido à perigosa incapacidade que estamos desenvolvendo de ouvir o outro. Não sei qual a explicação, mas tenho percebido que as pessoas apenas querem falar, falar, falar, e não lhes interessa saber o que outro pensa a respeito do assunto em pauta. Em geral, são como fontes, que no breu da noite continuam a verter água, impossibilitadas de refletir a paisagem em torno, encantadas unicamente pelo barulho que fazem e que a escuridão amplifica. Mais estranho ainda é que, em tempos de redes sociais, essa dificuldade de compreensão se estende até mesmo aos textos escritos. Ou seja, as pessoas tomam um trecho e, ou por o lerem de maneira desatenta ou por simplesmente não saberem interpretá-lo, rechaçam-no de maneira peremptória, encontrando nele coisas que não estão ali consignadas. E assim se destroem amizades, erguem-se desavenças, mancham- se reputações. Aliás, nós, brasileiros, temos uma enorme relutância em conviver com opiniões contrá- rias ou divergentes das nossas. Somos cordiais com todos aqueles que, de alguma maneira, comungam conosco pontos de vista similares, mas basta o menor sinal de contrariedade para demonstrarmos toda a nossa intolerância. Como não estamos acostumados ao exercício do diálogo, ao invés de buscar convencer o outro com argumentos, partimos imediatamente para a tentativa de aniquilá-lo, utilizando subterfúgios como a chacota, o sarcasmo, a desinformação e até mesmo a canalhice pura e simples. RUFATTO, Luiz. Disponível em http://brasil.elpais.com/brasil/ 2014/08/12/opinion/1407871072_537360.html. Acessado em 18 de agosto de 2014.
Observe a frase abaixo adaptada do texto 2:
"Em geral, as pessoas são como fontes, que no breu da noite continuam a verter água, impossibilitadas de refletir a paisagem em torno, encantadas unicamente pelo barulho que fazem e que a escuridão amplifica."
Assinale a alternativa que apresenta a reescritura correta da frase, sem prejuízo do sentido e sem desvios da norma-padrão da língua
a)
As pessoas são, em geral, como fontes, que no breu noturno seguem vertendo água, sem possibilidade de espelhar a paisagem circundante, maravilhadas unicamente com o seu próprio rumor, que é intensificado pela escuridão |
b)
As pessoas são como fontes que, em geral, continuam a verter água no breu da noite, incapacitadas de refletir a paisagem ao redor, que se deslumbra apenas com o ruído produzido e difundido na escuridão. |
c)
Ordinariamente, as pessoas são comparáveis à fontes que, no breu da noite, prosseguem a jorrar água, sendo, porém, incapazes de retratar a paisagem em torno por ter sido enlevada pela intensidade do barulho produzido pela escuridão. |
d)
Comumente, as fontes que continuam a verter água no breu da noite são comparáveis as pessoas, pela incapacidade de refletir o entorno em virtude do obscurecimento criado pelos mistérios da escuridão. |
e)
Via de regra, as pessoas são como fontes que seguem vertendo água na escuridão, a qual impede de refletir a paisagem à volta em virtude do arrebatamento causado pelo barulho intensificado pelo breu. |
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