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Comentários / FASEH - Faculdade de Saúde e Ecologia Humana - Vestibular - Fundep - 2013 - Medicina - 2.º Semestre de 2013 - Prova Manhã - Tipo A


Ler é Uma Revolução Cerebral

Por Mariana Sgarioni

Em Os Neurônios da Leitura (editora Penso, 2012, 372 páginas), o matemático e neurocientista francês Stanilas Dehaene, diretor da Unidade de Neuroimagem Cognitiva, de Paris, mostra que pesquisas da Psicologia Cognitiva Experimental comprovaram o centro de reconhecimento da palavra escrita no cérebro.

Dehaene é professor no Collège de France e membro da Academia Francesa de Ciência. Seus primeiros trabalhos foram voltados ao estudo sobre a maneira com que o órgão funciona no consciente e no inconsciente. O cientista sugere que a Pedagogia e a Psicologia busquem beneficiar-se dos estudos da neurociência para criar métodos de ensino mais eficazes.

Nesta entrevista, o francês defende que tal descoberta questiona metodologias de ensino que transformam o aluno numa máquina de soletrar, incapaz de dar atenção ao significado.

O senhor diz que a leitura causa reviravolta nas funções cerebrais preexistentes. Por quê? Em primeiro lugar, gostaria de lembrar que a leitura é uma das várias atividades que o homem criou nos últimos milhares de anos. E trata-se de uma das mais recentes. A escrita nasceu há uns 5.400 anos e o alfabeto propriamente dito não tem mais de 3.800 anos. Nos termos da evolução humana, esse tempo é mínimo. Nosso genoma ainda não teve tempo de se alterar para dar conta de desenvolver um cérebro adaptado à leitura. Por isso, afirmo que o ato de ler é uma revolução: porque, mesmo sem termos esta capacidade, o estudo de imagens cerebrais nos mostra que adquirimos mecanismos extremamente requintados, exigidos pelas operações da leitura.

Como isso acontece em nosso cérebro? Temos uma plasticidade sináptica desde que nascemos até a idade adulta. É ela que faz uma reconversão parcial da arquitetura do nosso córtex visual de primatas para reconhecer letras e palavras. Aprender a ler possibilita uma conversão de redes de neurônios, inicialmente dedicadas ao reconhecimento visual dos objetos. Embora não exista uma área préprogramada para a leitura, podemos localizar diversos setores do córtex cerebral como responsáveis pela atividade. Um setor está em contato com as entradas visuais; outro codifica estas entradas com precisão espacial; outro integra as entradas de uma vasta região da retina, e assim sucessivamente. É no córtex que estão os neurônios mais adaptados à tarefa da leitura. Mais especificamente, no córtex occipitotemporal esquerdo. No entanto, se no curso da aprendizagem, por alguma razão, esta região não estiver disponível, então a região simétrica do hemisfério direito entra em jogo.

O cérebro é tão plástico que é capaz de se transformar e atender a qualquer necessidade? Não. Há a teoria, aliás, revisitada por inúmeros pesquisadores, que adere a um modelo que eu chamo de plasticidade generalizada e relativismo cultural. Segundo ela, o cérebro seria tão flexível e maleável que não restringiria em nada a amplitude das atividades humanas. Diferentemente de outras espécies, inclusive, ele seria capaz de absorver toda forma de cultura. Pretendo mostrar em meu livro que dados recentes da imagem cerebral e da Neuropsicologia recusam esse modelo simplista. Ao examinar a organização cerebral dos circuitos da leitura, vemos que é falsa a ideia de um cérebro virgem, infinitamente maleável, capaz de absorver todos os dados de sua cultura. Entretanto, somos capazes de atividades extraordinárias, como ler. Sim, nosso cérebro é evidentemente capaz de aprender. Porém, essa capacidade é limitada. Em todos os indivíduos do mundo, não importa a cultura ou o idioma, a mesma região cerebral - com diferenças mínimas - é ativada para decifrar palavras escritas. Minha hipótese é diferente desta do relativismo. Proponho o que chamo de "reciclagem neuronal".

De acordo com essa hipótese, acredito que a arquitetura do nosso cérebro é construída com bases fortes genéticas. Mesmo assim, os sentidos do nosso córtex visual possuem uma margem de adaptação, uma vez que a evolução nos dotou de certa plasticidade e capacidade de aprendizagem. Isso quer dizer que os mesmos neurônios que reconhecem rostos ou corpos podem desviar-se de suas preferências e responder a objetos ou formas artificiais, como as letras. Nosso cérebro se adapta ao ambiente cultural não respondendo cegamente a tudo o que lhe é imposto. Ele converte a outro uso suas disposições já presentes. Ele faz o novo com o velho. O cérebro não evoluiu para a escrita. Foi a escrita que evoluiu para nosso cérebro. Examine com atenção os sistemas de escrita. Eles revelam numerosos traços em comum: todos os sistemas, sem exceção, incluindo aí os caracteres chineses, usam um pequeno repertório de base, cuja combinação gera sons, sílabas e palavras. Essa organização se ajusta à hierarquia das nossas áreas corticais, cujos neurônios reconhecem unidades de tamanho e invariância crescentes. O tamanho e a posição dos caracteres também correspondem à nossa capacidade de visualização e retenção.

Entrevista disponível em: http://revistalingua.uol.com.br/textos/87/ler-e-uma-

revolucao-cerebral- 276200-1.asp Acesso em: 4 jun.2013. [Fragmento]

Questão:

Assinale a alternativa em que a ideia apresentada entre parênteses explicita o sentido introduzido pelo termo destacado no trecho.

Resposta errada
a)

Nosso genoma ainda não teve tempo de se alterar para dar conta de desenvolver um cérebro adaptado à leitura. (consequência)

Resposta errada
b)

Por isso, afirmo que o ato de ler é uma revolução. (finalidade)

Resposta errada
c)

Embora não exista uma área pré-programada para a leitura, podemos localizar diversos setores do córtex cerebral [...]. (conclusão)

Resposta correta
d)

Entretanto, somos capazes de atividades extraordinárias, como ler. (oposição)

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